sexta-feira, 25 de março de 2011

Meus pés e o inevitável

*A Alexandre Arthur, irmão não-consanguíneo.


Pobres são meus pés, sempre num eterno e inexorável movimento. Aposto que sob os cobertores, enquanto se aconchegam da frialdade noturna, maldizem o dia em que me puseram de pé. Ah, se eles soubessem que tal hercúleo trabalho jamais seria recompensado devidamente, não haveriam de ter me ajudado a sair da quadrupidez. Desde que pus as minhas solas virgens no firmamento do solo, não parei mais de andar.

Primeiro vieram passos lentos e vacilantes. Hesitava, pois, como hesita todo aprendiz. Andei neste ritmo durante muito tempo. Não era nem que eu quisesse hesitar, mas o comprimento de minhas pernas - e do meu conhecimento - me impediam de ir muito mais além. Foi nesta mesma época que conheci o tempo. Este, que é a pressa das coisas, que vive a correr e não espera ninguém. Obviamente, contudo, isto era algo que eu não era capaz de entender.

Mas o tempo não se apresenta a ninguém. Ele simplesmente passou e, quando dei por mim, estava dando passos mais firmes. Parecia que meu púbere ser se envergonhava dos passos despretenciosos - ou lerdos, como eu diria à época - da infância. Tomei conhecimento do tempo e quis alcançá-lo. Me feria o orgulho saber que algo que eu não via podia ser tão mais rápido que eu. Quis, em vão, correr atrás do tempo.

Nesta maratona, calejei meus pés. E benditos sejam esses calos! Uma vez que nos tornamos insensíveis ao caminho, passamos a andar mais depressa. Neste momento da vida, eu não mais caminhava - apenas corria. Corri para me firmar, me apressei para tomar caminhos que passaram despercebidos até então. Entrei numa eterna corrida: atrás de mulheres, de prazeres, de conforto, de status...

A esta altura, não mais me preocupava em alcançar o tempo. Correr tornou-se um hábito quase mecânico. Depois de uma vida inteira, havia desaprendido a andar. Me faltava calma e parcimônia. E continuei correndo até o dia em que, abismado, me vi parado na frente de grandes telas, que transmitiam todo tipo de imagem. Estava sozinho ali, raciocinando sobre tanta insanidade, quando me dei por conta de onde estava. Eu havia, enfim, ultrapassado a marcha do tempo. E aqueles que dormitavam ali em minha frente, em visões anacrônicas, eram os acontecimentos das eras todas. Quando compreendi isto, dei conta também de que estava novamente parado. Finalmente terminei aquela corrida e meu nome constava no hall da fama dos que completaram tal façanha: o obituário do jornal da semana.

Um comentário:

  1. Tá vendo, basta um empurrãozinho que nasce a star! rs

    E eu fiquei de quatro pra "não haveriam de ter me ajudado a sair da quadrupidez.", kkkkkkkkk duca!

    É NÓS, BROTHA, SOMOS FODA E TODAY IS FRIDAY!

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